Iberbibliotecas

Leonardo Quintanilha, uma conversa sobre bibliotecas brasileiras

Leonardo Quintanilha é Coodenador-Geral do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas do Brasil, SNBP, há alguns meses. Falámos com ele sobre o estado atual e futuro das bibliotecas no seu país, membro do Iberbibliotecas com maior número de bibliotecas públicas e comunitárias e o único de língua portuguesa.

Você lidera o SNBP em seu país há alguns meses. Quais são os desafios mais urgentes para o fortalecimento das bibliotecas públicas?

- Hoje o desafio mais urgente é garantir, com todo os entes da federação, a celebração dos acordos de cooperação em prol das bibliotecas públicas. O Brasil é um país bem grande; dividem- no 27 unidades federativas (estados e distrito federal) com certo grau de autonomia. Exceção feita à Biblioteca Demonstrativa do Brasil, sediada na capital do país, o governo federal não tem ingerência direta sobre as bibliotecas públicas, que ficam mais sob os cuidados de estados ou municípios. Precisa então de um intermediário. Por isso cada estado constitui para si um sistema próprio. Para dar um exemplo: mesmo contabilizar as bibliotecas públicas é uma dificuldade. Dependemos desses informes até para saber quantas existem. Portanto, os sistemas estaduais repassam as informações que lhes cabe ao sistema nacional, e este as consolida numa base geral que procure refletir com maior fidelidade possível a realidade de todo país. De modo que, como meio de assegurar as obrigações e deveres entre os sistemas nacional e estaduais, têm grande importância esses acordos de cooperação. São compromissos formais que permitem pensar, formular e executar políticas segundo as necessidades e os dados de cada região, servindo de meio hábil para estabelecer prioridades para bibliotecas públicas, e com isso elaborar políticas capazes de modernizá-las e, assim, fortalecê-las.

Você lidera o SNBP em seu país há alguns meses. Quais são os desafios mais urgentes para o fortalecimento das bibliotecas públicas?

Em alguma medida essas diferenças costumam refletir as dificuldades econômicas de cada região do Brasil. Vemos aqui cidades com bibliotecas públicas bem conservadas e desenvolvidas, exuberantes, de arquitetura tradicional ou moderna, em que constantemente o acervo se renova e os bibliotecários se qualificam. Só que em muitos cantos do Brasil a realidade é mais brutal, e a estrutura é mais precária. Não é fácil, sobretudo num país deste tamanho, e com tantas dificuldades. No caso, o poder regional mantém a biblioteca pública; logo, se ele vai mal, ela acaba também prejudicada. Ao contrário do que pode parecer, porém, essa correspondência é mais tendência que regra: mesmo em regiões mais ricas, diversas bibliotecas públicas ficam sem receber o tratamento que merecem. E há regiões teoricamente mais pobres que abrigam bibliotecas fantásticas. É um problema grande, dentro de um contexto maior, cultural, já de longa data, em que a leitura e as bibliotecas estão inseridas; talvez como o ponto mais frágil da corda. A despeito de suas limitações de recurso e estrutura, contudo, o SNBP tem trabalhado para que isso mude.

O Brasil é um dos membros mais ativos do Iberbibliotecas e o único de língua portuguesa. O que você acha da participação nesses projetos de cooperação internacional em relação às bibliotecas do seu país?

Para o Brasil é fundamental. Sobretudo por ser ali o único representante de língua portuguesa; o que já traz uma grande responsabilidade. De maneira eficaz, o programa promove um fluxo de informações das mais qualificadas na Ibero-América, combinando esforços de países em cujas culturas se encontra todo um tronco comum, e nele várias semelhanças, históricas e geopolíticas, que facilitam o diálogo e a troca de experiências. Para as bibliotecas do Brasil, as ações que se executam por meio do programa acabam por oferecer as mais ricas e proveitosas oportunidades para viabilizar o acesso ao conhecimento e o trânsito de pessoas.

Em relação à pergunta anterior, no Iberbibliotecas temos a participação de pessoas de países de língua portuguesa da África em diferentes cursos. Como é o vínculo do Brasil e da Ibero-América com esses países no tema das bibliotecas e como deve ser fortalecido?

O Brasil tem intensificado, já há algumas décadas, o seu diálogo com os países da África, e a cooperação técnica tem surgido como o instrumento central da ação externa brasileira, privilegiando a transmissão do conhecimento. Com o advento da Agenda 2030 a orientação é de alinhamento aos objetivos da agenda em todas os programas, projetos, ações ou atividades a que o país se dedique. Da mesma forma, o mais recente documento estratégico de cooperação dos países membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, para 2020 a 2026, se coaduna com a visão da CPLP para o período de 2016 a 2026, adotada pela XI Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP. Estabelecem esses documentos uma prioridade em comum no incremento da cooperação em todos os setores prioritários, como a educação e a cultura. Nesse sentido, e alinhados com essa visão estratégica, o Sistema Nacional de Biblioteca Públicas vem se aproximando dos países da CPLP para implementar cooperações técnicas que no futuro facilitem mais o fluxo de informação na comunidade. Dar aos bibliotecários acesso aos cursos de capacitação promovidos pelo Iberbibliotecas é o primeiro passo para alcançar esse objetivo e para fortalecer a aproximação da Ibero-América com a CPLP.

O Brasil tem um grande trabalho em material de cultura comunitária, algo que se reflete na forte presença de bibliotecas comunitárias nas comunidades. Qual é o trabalho do SNBP com esse tipo de biblioteca?

Embora não compreendidas no nome do SNBP (sistema nacional de bibliotecas públicas), as bibliotecas comunitárias também são em parte amparadas por ele. De origem espontânea na sociedade civil, de onde tiram sua legitimidade, essas bibliotecas não estão vinculadas a nenhum ente estatal. Mas nem por isso o Estado deve ser indiferente a elas. Talvez seja esse até um incentivo a se fazer mais presente: ajudando-as no que por si não conseguem fazer e não atrapalhando naquilo que já fazem perfeitamente bem. É em tal contexto que o sistema nacional tem procurado atender às bibliotecas comunitárias. Principalmente na formação dos que se dedicam a elas. Grande parte desse trabalho é feito por meio do próprio Iberbibliotecas, sobretudo com cursos, oficinas, editais e intercâmbio. Normalmente, nessas comunidades, são pessoas comuns que se esforçam para oferecer o acesso ao livro e à leitura a crianças e jovens. Acaba havendo sempre uma demanda por aprimoramento técnico. Ainda nesse sentido é que o SNBP oferece, tanto para bibliotecas públicas quanto para comunitárias, o serviço de assistência técnica, por meio da Biblioteca Demonstrativa do Brasil. De lá os profissionais dão várias instruções sobre a criação e a modernização de bibliotecas, buscando integrá-las numa cadeia de informações que depois poderá se reverter em projetos.

Em termos de treinamento do pessoal da biblioteca, que necessidades você encontra?

Vejo duas necessidades principais: 1) um número maior de pessoas formadas para atuar em bibliotecas; 2) uma qualificação especificamente direcionada às bibliotecas públicas. No Brasil há estados que contam, em todas as bibliotecas públicas que abriga, com não mais do que três, quatro bibliotecários. Diversas bibliotecas sem nenhum. Evidente: antes uma biblioteca aberta sem bibliotecários do que fechada por falta deles. Mas é um problema real, e não isento de consequências práticas. A essa carência se junta ainda uma outra dificuldade, que deriva da primeira. Não se preparam pessoas para atuar em bibliotecas públicas. Falta por vezes aquele conhecimento mais íntimo, específico dos desafios que só elas enfrentam, e que acaba sendo adquirido na experiência cotidiana. Portanto, algum curso específico para profissionais de bibliotecas públicas seria muito bem recebido.

Soraia Magalhães

Escritora de libros infantiles y creadora y editora del blog Caçadores de Bibliotecas. Doctora por la Universidad de Salamanca, España (Programa de Doctorado Formación en la Sociedad del Conocimiento). Máster en Sociedade e Cultura na Amazônia y Licenciada en Biblioteconomía, ambos de la Universidade Federal do Amazonas. Participó como colaboradora la revista Biblioo.

Activista de acciones centrada en el fortalecimiento de las bibliotecas públicas, obtuvo en 2013 el Premio Movers  Shakers, del Library Journal en los Estados Unidos y el premio Genesino Braga del Consejo Regional de Biblioteconomía de la biblioteca CRB-11, por su participación en el Movimiento Abre la Biblioteca que solicitó la reapertura de la Biblioteca Pública del estado de Amazonas cerrada por más de 5 años.

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Adriana María Betancur B.

Bibliotecóloga, especialista en Gestión Pública; con amplia experiencia y trayectoria en la gestión de bibliotecas públicas, servicios de información local y políticas públicas. Estuvo vinculada a la Biblioteca Pública Piloto de Medellín; creadora y coordinadora de los servicios de información local, Jefa del Departamento de Cultura y Bibliotecas y Gerente de Educación, Cultura y Bibliotecas de la Caja de Compensación Familiar de Comfenalco Antioquia. Su última publicación del 2019 fue «Integración de las Bibliotecas Públicas en los planes de Desarrollo Territorial: estrategias y desafíos» publicado en la Editorial de la Biblioteca Pública Piloto con fondos de ayudas del Programa Iberoamericano de Bibliotecas Públicas, Iberbibliotecas.

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Oskar Hernández

Gestiona desde 2020 la Hemeroteca General de la Universidad Autónoma de Barcelona (UAB) y es candidato a doctor en el campo de los Estudios Sociales de la Ciencia y la Tecnología por la misma universidad (Departamento de Psicología Social). Sus intereses
de investigación giran alrededor de la participación ciudadana en contextos abiertos de experimentación, las prácticas de innovación en entornos bibliotecarios y las transformaciones que están experimentando actualmente las bibliotecas. Desarrolla su trabajo en los grupos de investigación STS-b, Barcelona Science and Technology Studies (UAB) y Social Impact of Artificial Intelligence (Centro de Visión por Computador, CVC-UAB). Es miembro del Grupo de Trabajo Estratégico Laboratorios Bibliotecarios (Ministerio de Cultura y Deporte del Gobierno de España) y del grupo promotor del Lab Bibliotecas del Instituto Cervantes. Forma parte del panel de expertos
del proyecto europeo LibrarIn (sobre innovación y transformación en bibliotecas públicas), financiado por la Unión Europea. Ha trabajado para la Comisión Europea como evaluador externo de proyectos I+D+I del programa Horizonte Europa (2021-2027). Está afiliado a la Society for Social Studies of Science y, entre 2021-2023, fue el vicepresidente de la Sociedad Española de Documentación e Información Científica (SEDIC). Más información y datos de contacto: https://www.linkedin.com/in/oskarhernandez/

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Oskar Hernández

Desde 2020, dirige a Hemeroteca da Universidade Autônoma de Barcelona (UAB) e é doutorando na área de Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia na mesma universidade (Departamento de Psicologia Social). Os seus interesses de investigação giram em torno da participação cidadã em contextos de experimentação aberta, das práticas de inovação em ambientes bibliotecários e das transformações que as bibliotecas estão a experienciar atualmente. Desenvolve seu trabalho nos grupos de pesquisa STS-b, Estudos de Ciência e Tecnologia de Barcelona (UAB) e Impacto Social da Inteligência Artificial (Centro de Visão Computacional, CVC-UAB). É membro do Grupo de Trabalho Estratégico de Laboratórios de Bibliotecas (Ministério da Cultura e Esporte do Governo de Espanha) e do grupo promotor das Bibliotecas Laboratório do Instituto Cervantes. Faz parte do painel de especialistas do projeto European LibrarIn (sobre inovação e transformação em bibliotecas públicas), financiado pela União Europeia. Trabalhou para a Comissão Europeia como avaliador externo de projetos de I&D&I do programa Horizonte Europa (2021-2027). É afiliado à Sociedade de Estudos Sociais da Ciência e, entre 2021-2023, foi vice-presidente da Sociedade Espanhola de Documentação e Informação Científica (SEDIC). Mais informações e contato: https://www.linkedin.com/in/oskarhernandez/

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Adriana Maria Betancur B.

Bibliotecária, especialista em Gestão Pública; com ampla experiência e histórico na gestão de bibliotecas públicas, serviços de informação locais e políticas públicas. Trabalhou na Biblioteca Pública Piloto de Medellín; criadora e coordenadora de serviços de informação local, Chefe do Departamento de Cultura e Bibliotecas e Gerente de Educação, Cultura e Bibliotecas do Fundo de Compensação Familiar Comfenalco Antioquia. A sua última publicação de 2019 foi “Integração das Bibliotecas Públicas nos planos de Desenvolvimento Territorial: estratégias e desafios” publicada no Editorial de la Biblioteca Pública Piloto com fundos de ajuda do Programa Ibero-Americano de Bibliotecas Públicas, Iberbibliotecas.

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Soraia Magalhães

Escritora de livros infantis e criadora e editora do blog Caçadores de Bibliotecas. Doutor pela Universidade de Salamanca, Espanha (Programa Doutoral Formação na Sociedade do Conhecimento). Mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia e Bacharel em Biblioteconomia, ambos pela Universidade Federal do Amazonas. Participou como colaboradora da revista Biblioo. Ativista de ações focadas no fortalecimento de bibliotecas públicas, em 2013 ganhou o Prêmio Movers & Shakers do Library Journal nos Estados Unidos e o prêmio Genesino Braga do Conselho Regional de Bibliotecas da biblioteca CRB-11, pela participação no programa Open the Library Movimento que solicitou a reabertura da Biblioteca Pública do estado de Amazonas fechada há mais de 5 anos. Activista de acciones centrada en el fortalecimiento de las bibliotecas públicas, obtuvo en 2013 el Premio Movers  Shakers, del Library Journal en los Estados Unidos y el premio Genesino Braga del Consejo Regional de Biblioteconomía de la biblioteca CRB-11, por su participación en el Movimiento Abre la Biblioteca que solicitó la reapertura de la Biblioteca Pública del estado de Amazonas cerrada por más de 5 años.

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